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BRASIL NO TABULEIRO GLOBAL DA SOJA: ESCALADA DA GUERRA COMERCIAL ENTRE EUA E CHINA REPOSICIONA O PAÍS COMO FORNECEDOR-CHAVE

Com tarifas recordes entre as duas maiores economias do mundo, Brasil assume protagonismo nas exportações de soja, mas cenário exige cautela e gestão precisa diante de riscos logísticos e geopolíticos
O papel do Brasil neste novo tabuleiro global ainda está em construção. Foto: Urbana Caipira

Em um cenário de tensões crescentes no comércio internacional, o Brasil desponta como um dos principais protagonistas no mercado global de grãos. Em abril de 2025, a guerra comercial entre Estados Unidos e China atingiu novos e históricos patamares: tarifas de 125% impostas por Pequim sobre produtos norte-americanos e 145% aplicadas por Washington sobre produtos chineses praticamente paralisaram o fluxo bilateral de comércio entre as duas maiores potências econômicas do planeta. A disputa, carregada de acusações de manipulação cambial, barreiras não tarifárias e jogos de poder geopolítico, tem causado impactos profundos sobre a formação de preços agrícolas — especialmente da soja — e abriu uma janela estratégica para o Brasil.

A nova rodada de embargos e sanções comerciais reacendeu o interesse da China pelo produto brasileiro. De acordo com Felipe Jordy, gerente de inteligência e estratégia da Biond Agro, o movimento foi imediato: “A China não apenas retaliou as tarifas dos EUA, como também intensificou as compras no Brasil, com destaque para a aquisição de pelo menos 40 navios de soja entre maio e julho”. Essa movimentação reforça o posicionamento do Brasil como um fornecedor confiável e estrategicamente neutro em meio à instabilidade entre os gigantes.

No entanto, a ascensão do Brasil nessa conjuntura não vem sem desafios. O redirecionamento da demanda chinesa gerou valorização expressiva dos prêmios de exportação nos portos brasileiros, ultrapassando a marca de US$ 1,00 por bushel, um pico que há tempos não era observado. Mas essa valorização ocorre em um ambiente de alta complexidade logística e instabilidade nos fundamentos de mercado.

Segundo dados da própria Biond Agro, os estoques brasileiros de soja estão nos níveis mais baixos dos últimos cinco anos, o que impõe um limite prático à capacidade de resposta imediata do país. A cobertura de safra da China — estimada em 110 milhões de toneladas para 2024/2025 — já está comprometida em pelo menos 70%, o que significa que a janela de oportunidades para o Brasil tende a ser curta.

“Essa é uma janela que pode se fechar rapidamente. Os embarques de abril a junho já estavam parcialmente comprometidos, e agora com essa nova rodada de compras, a cobertura da China se estende ainda mais”, alerta Jordy. A pressão sobre a logística interna e sobre os portos se intensifica, ao mesmo tempo em que há um descompasso entre os preços internos e as cotações na Bolsa de Chicago (CBOT), influenciada por expectativas de aumento da área plantada nos EUA e por estoques elevados.

Essa diferença entre prêmios e bolsa configura, na visão de Jordy, um cenário típico de especulação momentânea. “Esse descolamento entre prêmios e bolsa é típico de um momento especulativo e que rapidamente foi corrigido com uma tomada de volume da China e ainda uma ampla oferta no Brasil. A oportunidade existe, mas é sensível ao noticiário e à diplomacia”, observa.

Diante dessa conjuntura, especialistas alertam para a importância da gestão de risco. A volatilidade do mercado em 2025 — impulsionada por fatores climáticos, custos logísticos e instabilidade geopolítica — exige planejamento meticuloso. “O ano de 2025 já trouxe desafios adicionais, com clima irregular, alta nos custos logísticos e agora a guerra comercial. A volatilidade é parte do jogo, mas a previsibilidade da gestão é o que transforma um bom ano em um excelente resultado”, afirma Jordy.

A orientação técnica é clara: mais do que correr atrás de preços altos, produtores devem trabalhar com metas de comercialização bem definidas, buscar proteção de margem via contratos antecipados e alinhar cada decisão à realidade logística e ao fluxo de embarques.

O papel do Brasil neste novo tabuleiro global ainda está em construção. Se por um lado a dependência chinesa pode representar ganhos no curto prazo, por outro, a imprevisibilidade do cenário exige que as decisões agrícolas deixem de ser apenas comerciais e passem a ser estratégicas. A leitura do contexto internacional, a gestão de risco e a eficiência logística tornam-se os pilares para a sustentação da competitividade brasileira — hoje, e no futuro.

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