A recente queda nos preços do milho trouxe alívio imediato ao produtor de leite brasileiro, em um momento em que os custos com alimentação animal tendem a subir devido à chegada do período seco. No entanto, o cenário favorável pode não durar. Analistas apontam que fatores logísticos internacionais, tarifas previstas e mudanças no fluxo das exportações podem pressionar a oferta interna e reverter a curva de preços ainda no segundo semestre de 2025.
Segundo dados apurados pela frente de inteligência de mercado da JPA, a cotação da saca de milho recuou mais de 15% entre março e meados de maio deste ano. A saca, que custava R$ 89,12, passou a ser negociada por R$ 75,47, puxada por uma série de fatores conjunturais como a colheita de uma segunda safra robusta, a estabilidade cambial e a retração na demanda internacional. Essa combinação resultou em uma folga nos estoques internos e reduziu os custos de formulação de ração, item essencial na pecuária leiteira.
“O preço do leite tem uma correlação muito direta com o preço do milho. Quando o milho sobe, o leite tende a subir, e quando ele cai, o custo de produção do leite também recua. Essa queda atual representa um fôlego importante, principalmente porque estamos entrando no período seco do ano, quando o produtor precisa gastar mais com ração”, afirma Marcelo Teixeira, especialista em mercado e um dos fundadores da equipe de análise da JPA.
A queda no preço do milho, somada à baixa nos preços de outros componentes proteicos, como farelo de soja e torta de algodão, tem contribuído para uma redução consistente no custo por litro de leite. Embora a entressafra tradicionalmente imponha desafios ao produtor, a atual conjuntura de preços de insumos tem equilibrado a balança.
“Além do milho, o farelo de soja também está com preços historicamente baixos. E embora estejamos em período de entressafra, a torta de algodão também deve ficar barata com o avanço da safra a partir de agosto. Tudo isso ajuda a compor uma ração mais acessível e, portanto, barateia o custo final do litro de leite produzido”, detalha Marcelo.
Produção em alta, mas demanda fraca limita preços ao produtor
O último relatório de mercado leiteiro elaborado pela equipe da JPA revela que o preço do leite pago ao produtor em Minas Gerais caiu 2,1% entre março e abril, fechando o mês em R$ 2,93 por litro, mesmo com a redução nos custos de produção.
“Apesar da expectativa de menor oferta de leite na seca, a demanda interna e industrial ainda está fraca. Isso limita os repasses e explica a resistência dos preços em subir, mesmo com custo reduzido”, explica o analista.
De acordo com o relatório, os preços médios spot do leite caíram 6,04% em Minas Gerais e 4,72% em São Paulo no mesmo período. Ainda assim, os produtores mineiros acumulam uma valorização de 12,41% na comparação com abril de 2024.
Cenário externo pode mudar a rota dos preços
Apesar da atual calmaria, as projeções da equipe da JPA indicam que o mercado deve permanecer em alerta, especialmente diante do avanço das exportações brasileiras de milho. Caso a demanda internacional aumente, a oferta doméstica pode ser comprimida, elevando novamente os preços.
“A oferta está folgada, mas se os embarques brasileiros começarem a crescer rapidamente, o que pode acontecer se compradores externos buscarem milho aqui, a demanda internacional pode apertar o mercado interno e empurrar os preços para cima de novo”, afirma Marcelo.
Outro fator relevante é uma nova resolução tarifária nos Estados Unidos, prevista para outubro deste ano. A norma estabelece uma sobretaxa para navios fabricados na China que atracarem em portos norte-americanos. Essa medida pode encarecer significativamente o frete de produtos como o milho, que têm baixo valor agregado por tonelada.
“A partir de outubro, qualquer navio chinês ou construído na China que atracar em portos americanos será taxado por tonelada. Como milho é uma commodity barata, essa taxa encarece muito o produto. Isso pode fazer com que países que hoje compram dos EUA passem a buscar milho no Brasil ou na Argentina. Se isso acontecer, nós passamos a atrair forte demanda de fora”, projeta o especialista.
Estoque estratégico é recomendação para o produtor
Diante da instabilidade possível no mercado global e dos sinais de recuperação da demanda externa, a recomendação é clara: o produtor precisa agir com cautela nas compras e pensar estrategicamente.
“Para o produtor de leite, o momento é ideal para controlar estoques e pensar em compras inteligentes de insumos. No caso do farelo de soja, é interessante montar um estoque mínimo para se proteger de oscilações de curto prazo. Já com o milho, o ideal é comprar de acordo com a necessidade, sem estocar muito. O mercado está muito sensível às exportações e às decisões geopolíticas”, orienta Marcelo.
Dados do IBGE indicam que a captação média diária de leite no Brasil cresceu 4,3% no primeiro trimestre de 2025 em relação ao mesmo período de 2024. Apesar do aumento na oferta, os preços seguem travados pela demanda reprimida e pelos altos estoques da indústria.
A atual fase de queda nos preços do milho representa um alívio pontual para a cadeia leiteira, mas os próximos meses exigirão atenção redobrada. Variáveis internacionais — como tarifas, custos logísticos e mudanças no comportamento dos grandes compradores — serão determinantes para o comportamento do mercado interno. A palavra de ordem, neste momento, é vigilância. O produtor que estiver atento aos sinais do mercado pode tomar decisões mais seguras e manter a competitividade mesmo diante de possíveis mudanças no segundo semestre.