O arroz com feijão, combinação que atravessa gerações e simboliza a identidade alimentar do Brasil, vem perdendo espaço na rotina das famílias. Dados recentes revelam uma mudança significativa no padrão de consumo: no primeiro semestre de 2025, o consumo de arroz caiu -4,7%, enquanto o de feijão registrou retração de -4,2%, mesmo diante da queda expressiva nos preços, de -14,2% para o arroz e -17,5% para o feijão, segundo levantamento da Scanntech.
Essa realidade reflete uma transição cultural e comportamental. Cada vez mais pressionada pela correria do cotidiano, a população tem priorizado praticidade e conveniência, substituindo a tradicional dupla por pratos prontos, congelados e receitas rápidas, em que proteínas, saladas e carboidratos alternativos ganham protagonismo. Só no primeiro semestre deste ano, as vendas de refeições prontas cresceram 6,5% no varejo alimentar, mostrando uma clara guinada no cardápio do consumidor brasileiro.
Outro fator que ajuda a explicar a mudança é a transformação no perfil das famílias. O número crescente de pessoas morando sozinhas, somado ao endividamento provocado por fatores como o avanço das apostas online, influencia diretamente as escolhas na hora das compras.
Consumo em queda contínua
A tendência de retração não é recente. Dados da Embrapa apontam que o consumo per capita de arroz caiu de 40 kg por habitante em 1985 para 28,2 kg em 2023. Já o feijão, antes consumido em média 19 kg por pessoa, caiu para 12,8 kg no mesmo período. Esses números refletem a substituição gradual do prato tradicional por outras combinações alimentares.
Para a diretora de marketing da Scanntech, Priscila Ariani, essa é uma consequência direta das novas prioridades de consumo. “A população vive uma rotina corrida, em que praticidade e conveniência ditam as escolhas dos shoppers. Por isso, eles buscam opções financeiramente vantajosas que facilitem o preparo de refeições rápidas, fáceis e saborosas. Com a adesão crescente a uma alimentação mais saudável, o comportamento de consumo muda e impacta itens antes presentes na rotina do brasileiro”, afirma.
Carnes também perdem espaço, hortaliças avançam
A mudança de comportamento não se restringe ao arroz e ao feijão. A carne bovina, considerada por muitos um símbolo da mesa nacional, também foi impactada. Ainda de acordo com a Scanntech, a demanda por carnes caiu -3,2% no período analisado, enquanto o consumo de legumes e verduras avançou 10,9%.
O fator preço é decisivo nessa equação. Enquanto as hortaliças tiveram queda de -22,8% nos valores, a cesta de açougue e peixaria ficou 18,4% mais cara, o que fez muitos consumidores priorizarem alimentos mais acessíveis e nutritivos.
A batata é um exemplo marcante dessa transformação: com queda de -41% no preço, tornou-se ainda mais presente nos lares brasileiros. Em contrapartida, a carne bovina subiu 24%, reduzindo sua presença no carrinho de compras.
Cesta alimentar em transformação
Essas mudanças refletem na composição da cesta de perecíveis. Em 2024, frutas, legumes e verduras (FLV) representavam 45,8% do volume total, enquanto açougue e peixaria correspondiam a 27,7%. Já em 2025, os números mostram uma inversão sutil: a participação de FLV avançou para 48,0%, enquanto a de açougue e peixaria caiu para 26,1%.
O que está em curso é uma transformação silenciosa, mas profunda, nos hábitos de consumo dos brasileiros. O arroz e o feijão, que sempre ocuparam papel de destaque à mesa, dividem agora espaço com alternativas mais práticas, rápidas e adaptadas às novas realidades sociais e econômicas.